[photo de virginia tiavir]
hoje queria ter escrito uma história. daquelas com princípio e meio e fim e com uma narrativa que se encadeasse e fluisse e me deixasse envolver no próprio enredo. já tinha até pensado nos personagens e no alinhamento que ia seguir. consegui que a hora do banho dos kids e toda a azáfama de final do dia fosse mais ou menos célere, o jantar também foi sem turbulências e já só pensava no momento em que me ia sentar em frente ao pc para deixar as palavras ganharem forma. enquanto ia ultimando as mochilas para o dia seguinte e apanhando os inevitáveis casacos e pares de sapatilhas e brinquedos e livros de desenho espalhados pela casa ia desenrolando na minha cabeça toda uma acção que eu queria empolgante.
mas depois perdi-me. perdi-me em beijos prolongados nas bochechas fofas dos meus filhos, que repetidamente me chamavam para voltar ao quarto. “só mais um”, pedia o mais novo, suplicando mais um beijinho de boas noites de todas as vezes que eu tencionava sair; "faz-me festinhas aqui", dizia o mais velho apontando para a nuca num sorriso maroto. deixei-me perder nas próprias histórias que lhes li, uma sobre piratas e saques a outros barcos, outra sobre uma aventura em serralves, num mini livro já sem imagens. perdi-me ainda num telefonema inesperado de uma amiga que meia triste me contou que teve um dia mau e que as coisas em casa dela já não funcionam assim tão bem, e eu fui soltando palavras tontas numa esperança de a animar ...
por último, perdi-me comigo e contigo e com uma história que é a nossa, com o ritual do meu chá de todas as noites e com esse sofá que nos chama e nos faz aninhar em momentos doces, como que numa descompressão do dia que passou e num ânimo silencioso para o dia seguinte.
perdi o enredo que andava à procura mas tão-pouco me importou. essa história pode ainda surgir, num outro dia, numa outra hora, num outro contexto. perdi essa história para viver a minha, essa história tão real que é a minha própria vida acontecendo entre momentos tanto bonitos quanto rotineiros que me fazem sentir o pulsar e o doce sabor do dia-a-dia.
Sem comentários:
Enviar um comentário